ANP suspende fiscalização de combustíveis em julho por falta de verba
A ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) comunicou nesta segunda-feira (23/06) que suspenderá, durante todo o mês de julho, o Programa de Monitoramento da Qualidade dos Combustíveis (PMQC) em todas as regiões do país. A medida, motivada por restrições orçamentárias, atinge a fiscalização da qualidade da gasolina, do etanol hidratado e do óleo diesel – ação fundamental para garantir a procedência e segurança dos combustíveis.
Além de interromper a coleta e testes do PMQC, a ANP também reduzirá o alcance do Levantamento Semanal de Preços de Combustíveis (LPC). O estudo, que avaliaria 459 cidades no segundo semestre de 2025, será limitado a apenas 390 para combustíveis automotivos e 175 para o GLP (gás de cozinha). A agência justifica que os corte reforçam a necessidade de reorganização das atividades, diante dos valores reduzidos que suportam o órgão desde 2013.

Guia do Conteúdo
Orçamento derretido em 80% desde 2013
Segundo dados divulgados pela própria ANP, os recursos para despesas discricionárias sofreram uma queda de 82% entre 2013 e 2024, descontando a inflação. Se em 2013 estavam disponíveis R$ 749 milhões (reajustados pelo IPCA), no ano passado o montante foi reduzido para R$ 134 milhões. Para 2025, havia previsão de apenas R$ 140,6 milhões, e um novo decreto (12.477) bloqueou R$ 7,1 milhões e contingenciou R$ 27,7 milhões, restando somente R$ 105,7 milhões para todas as despesas.
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O corte impôs economia imediata também:
- Suspensão do PMQC em julho.
- Limitação do levantamento semanal de preços.
- Redução do número de fiscais em campo.
- Restrições em diárias e passagens aéreas.
- Mudança de reuniões e audiências para o formato virtual.
O que é o PMQC e por que ele é importante
O Programa de Monitoramento da Qualidade dos Combustíveis foi criado em 1998 e tem como missão principal detectar desvios nas especificações técnicas dos combustíveis comercializados. As amostras coletadas em postos revendedores são analisadas em diversos laboratórios, incluindo o Centro de Pesquisas e Análises Tecnológicas (CPT) da ANP, além de entidades parceiras.
Os resultados são cruciais para orientar a atuação de fiscais da ANP, subsidiar ações do Ministério Público, Procons e institutos de metrologia, como o Inmetro. A suspensão do PMQC coloca em risco o controle sobre práticas nocivas, como fraude de mistura, adição de água ou solventes industriais, e danos aos motores.
Levantamento semanal de preços perde alcance
O LPC, pesquisa que informa os preços de gasolina, etanol, diesel e GLP em todo o Brasil, deixou de cobrir parte dos municípios incluídos no planejamento original. Na prática, o levantamento semanal passará a contemplar 390 cidades para combustíveis automotivos (antes eram 459) e apenas 175 para o GLP – contra um total previsto semelhante para 2024.

Menor amostragem impacta a capacidade de comparar preços, monitorar práticas abusivas e orientar consumidores e órgãos públicos. As informações se tornam menos abrangentes e podem comprometer a transparência do mercado.
ANP em modo de contenção geral
Para manter ao menos as operações mínimas, a ANP anunciou uma série de ajustes emergenciais além dos cortes nos programas:
- Redução de viagens internas e internacionais, com suspensão de diárias e passagens.
- Foco em reuniões online, audiências públicas e seminários em formato virtual para economizar recursos.
- Priorização de atividades essenciais, com equipes reduzidas em campo e maior centralização das decisões.
Consumidor e mercado: quem sai no prejuízo?
O fim temporário do PMQC representa risco direto ao consumidor, que fica sem garantias oficiais sobre a procedência do combustível. Sem coletas regulares, o mercado pode trazer produtos adulterados, com falhas na octanagem, contaminação ou mistura irregular de etanol ou GLP, prejudiciais ao veículo e ao bolso de quem abastece.
Para o setor automotivo e empresas que dependem da confiabilidade do combustível, a ausência dos resultados pode gerar impactos na manutenção de frotas e custos operacionais. Já postos, distribuidoras e laboratórios deixam de ser submetidos ao controle regular, o que pode enfraquecer atuações contra fraudes e golpes.
Onde denunciar caso encontre combustível fora do padrão
A ANP orienta quem suspeitar de irregularidade no combustível comprado a:
- Guardar o comprovante de compra.
- Registrar reclamação nos canais da ANP (site ou aplicativo).
- Acionar órgãos de defesa do consumidor, como Procons estaduais e municipais.
- Divulgar em redes sociais ou sites especializados, para pressionar fiscalização independente.
Desvios de especificação técnica são infrações ambientais, jurídicas e podem implicar em penalidades para os vendedores.
Cenário futuro: quando a fiscalização volta?
Com o orçamento ainda comprometido, a ANP estima que poderá retomar o PMQC em agosto, assumindo que a situação orçamentária seja revista e os recursos estejam liberados. Entretanto, sem sinalização de aumento político orçamentário, o período de restrição pode se estender além do mês de julho.
Caso a verba não seja readequada, outras atividades podem sofrer limitações: expansão do LPC, análise de novos produtos (biocombustíveis, GNV, aditivos) e projetos institucionais de pesquisa e desenvolvimento.

Reflexão final e apelo à sociedade
A interrupção temporária da qualidade do combustível evidencia fragilidades na gestão de recursos públicos. A exigência de transparência e fiscalização eficaz deveria estar entre as prioridades do setor energético. A sociedade, via consumidor e órgãos reguladores, precisa pressionar políticos e autoridades por retomada completa, garantindo a integridade dos combustíveis e a segurança de veículos e motoristas.
Até lá, a uma única recomendação permanece válida: ao abastecer, observe a procedência, pergunte sobre fornecedores e denuncie qualquer suspeita de adulteração. Se há risco, é melhor prevenir do que remediar.